segunda-feira, 29 de março de 2021

O silêncio das coisas tristes

 O SILÊNCIO DAS COISAS TRISTES


Todos os dias a mesma rotina quando me levanto nestes tempos estranhos em que um ser invisível, cínico e mortífero, nos mói a paciência e o juízo e nos revira a vida. Abro a janela de par a par e absorvo os mais diversos perfumes com que a Natureza nos presenteia. O chilrear e o cantar dos passarinhos nos seus variados timbres e o cheiro inebriante e diverso das árvores no início de uma nova estação que brota com toda a sua energia são momentos que marcam e nos fazem sonhar. Relaxo e fecho os olhos durante uns instantes, saboreando aquele momento único. De repente acordo daquela letargia fugaz, saborosamente incomodativa. Estremeço e fico alerta. Falta qualquer coisa! Há algo que não bate certo! Faltam-me sons que reconheço todas as manhãs. O ruído intenso dos motores dos automóveis e o autêntico vaivém de pessoas que absortas nos seus pensamentos andam como autómatas nas suas rotinas quotidianas. Observo com muita atenção tudo à minha volta. A azáfama de uma cidade em movimento, neste microcosmos do local onde vivo, transformou-se num silêncio incomodativo, forçado e falso. Um silêncio de duas faces, de uma claridade sonora de uma Natureza que dá azo a todo o seu esplendor e de uma escuridão causada por uma solidão que dói, uma ausência triste de todo um pulsar frenético de uma cidade que parou, movida pelo medo, pela precaução e pela inevitabilidade da impotência perante um inimigo poderoso e invisível que amedronta e que mata. A alegria da Natureza mesclada no silêncio da não vida humana ou da vida compartimentada por receios e angústias, misturam-se neste sentimento dual de felicidade e de tristeza profunda por tudo o que se transformou e mudou. A vida, essa, continuará inexoravelmente o seu caminho
Daniel Braga


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